Ah… o jogo do bicho!
Uma prática de entretenimento com mais de um século no Brasil e que ainda divide opiniões sobre sua viabilidade.
Desde sua origem no século XIX, a prática do jogo foi coibida pelas autoridades da época.
Afinal, o que desperta tamanha necessidade de controle sobre este tipo de jogo? Desde quando o jogo do bicho é uma contravenção penal?
A legalização desta atividade poderia reduzir os problemas e ainda aumentar a arrecadação do Estado?
Se você quer saber essas e outras questões sobre o jogo do bicho, venha comigo nesta leitura!
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A história do jogo do bicho
O jogo teve seu início de uma forma bastante inusitada, em 1892 no Rio de Janeiro.
O barão João Batista Drummond criou uma espécie de rifa para atrair visitante para o seu zoológico, em Vila Isabel.
Confira abaixo o ticket de entrada do antigo zoológico:
Como funcionava o jogo do bicho naquela época?
Simples: o barão fazia uma lista com 25 bichos e escolhi um deles e colocava numa caixa de madeira.
As pessoas que participavam do jogo, teriam que adivinhar qual animal fora escolhido pelo barão, o dono da banca.
É claro, que os participantes apostavam e, o ganhador, levava um prêmio muito maior do que o valor apostado!
Na verdade, a simples brincadeira evoluiu para um jogo que mobilizava centenas de pessoas diariamente para descobrir o animal sorteado.
E com isso, o jogo transformou em um formato mais “profissional”, com a compra de bilhetes e sorteios mais organizados pelos donos de diversas bancas que foram criadas na cidade do Rio de Janeiro.
A questão legal
No governo do presidente Getúlio Vargas em 1941, foi criado o Decreto-Lei n° 3.688, que tirou da legalidade o jogo tão apreciado ainda naquela época.
Desta forma, o jogo do bicho foi declarado como uma contravenção penal.
Vamos fazer um parêntesis aqui para explicar o “juridiquêz” acima. O pesquisador Rômulo Bulgarelli Labronici vai nos ajudar com esta discussão.
No Brasil as Infrações Penais se dividem em dois grupos: os crimes e as contravenções penais.
“O tipo de pena é diferenciado, uma vez que para os crimes é conferida uma intervenção mais grave na liberdade do condenado com previsão de reclusão ou detenção. Ao oposto de para as contravenções, que há apenas a previsão de prisão simples”, afirmou o pesquisador.
Em outras palavras, a contravenção penal tem um peso jurídico menor que um crime.
Por isso, o jogo do bicho ainda que não seja uma atividade legalizada no país, seu enquadramento jurídico não chega a ser tão grave.
Mas por que o jogo do bicho é ilegal?
Boa pergunta!
A discussão em torno deste tipo de atividade não é apenas jurídica. Ela também se diz respeito à moralidade e ao conceito de “certo e errado”.
Na justificativa do texto da lei, o jogo do bicho é uma infração por ser considerado um jogo de azar.
Labronici cita que reforça “que os bens jurídicos tutelados para a contravenção penal do jogo do bicho se enquadrariam a partir da ideia dos bons costumes”.
Vamos lembrar que o decreto-lei que colocou o jogo do bicho na ilegalidade é da época do Getúlio Vargas, no contexto do Estado Novo.
Naquele período, o presidente estava envolto em um moralismo político muito forte. A moralização dos costumes era uma pauta oficial do seu governo.
Tanto é que a censura foi institucionalizada durante sua gestão, de forma que a diversão pública passou a ser vigiada pelos agentes do Estado.
Ou seja, a atividade do jogo foi considerada um problema para a sociedade, porque ela supostamente corrompia as boas práticas sociais.
Você consegue perceber o quanto isso é polêmico?
As loterias oficiais não envolvem vícios e desvirtudes? Mas por que elas são legais?
Enfim, vamos avançar nesta discussão!
O bicho e o poder: tem muita coisa em “jogo”
O jogo do bicho não é só uma questão de entretenimento. Acima de tudo, ele é um negócio!
E tudo que envolve dinheiro, meu amigo ou minha amiga… pode atrair confusão!
E se engana quem acha que o jogo do bicho não tem muito dinheiro envolvido.
Quem vê os botecos mais simples com muitos apostadores nem imagina…
Na verdade, existe uma relação de poder entre os donos das bancas – chamados de bicheiros – e os apostadores.
Esses bicheiros começaram, lá na década de 1940, a lotear a cidade do Rio e distribuir seus pontos de compra e venda de jogos.
O sistema começou a se “profissionalizar” de tal forma que os donos das bancas de apostas se transformaram em donos de uma espécie de poder paralelo.
Bingo!
Agora você percebe o quanto isso se tornou perigoso?
Portanto, o jogo do bicho envolve questões que vão além da moral.
A relação de poder e os laços desses bicheiros com a população e o poder público tornou-se determinante para a transformação deste jogo em ilegal.
Na verdade, por incrível que pareça, como o jogo se tornou cada vez mais popular, a figura desses bicheiros também foi moldada na mentalidade da população.
Ora considerados homens bons, ora denominados bandidos (não, bandido é uma palavra forte. São contraventores!), os bicheiros estão completamente envolvidos com as comunidades.
Além disso, em muitas situações, os donos das bancas também ajudam as populações mais carentes.
Desta forma, o jogo do bicho é caracterizado pelas contradições que são inerentes à sua atividade.
Afinal de contas, ele é um jogo popular e, por isso, faz parte da cultura do povo.
Mas… a exploração econômica sob o jogo do bicho também existe, de forma que não podemos “fechar os olhos” diante dessa situação.
Não é incomum a associação do nome de bicheiros ligados a tipos de crimes mais pesados, sendo o jogo do bicho apenas a menor das práticas ilegais que essas pessoas estão envolvidas.
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O dinheiro do jogo do bicho
A lógica do jogo do bicho, a princípio, parece ser difícil de entender.
O pesquisador Danilo Freire aborda justamente isso em sua pesquisa sobre o jogo do bicho e os negócios.
Como uma pessoa poderia entregar seu dinheiro na mão de um contraventor e esperar que ele pagasse o prêmio para o vencedor?
E se ele não pagar? E se o jogo for totalmente falso?
Não tem como reclamar no Procon ou entrar na justiça pedindo indenização.
Pois é…
O jogo do bicho só parece ser amador!
Os bicheiros construíram sobre si uma aura de credibilidade diante da população.
Por isso, a antiga prática de publicar os resultados do jogo do bicho nos postes até hoje é recorrentes em muitos lugares:
Por isso que as pessoas continuam a jogar.
Veja as razões abaixo:
- Porque confiam que irão receber caso ganhem;
- Elas enxergam os benefícios sociais de participar do jogo do bicho
- O dono da banca cria uma relação de confiança e distribui benefícios para funcionários e clientes.
Bingo de novo!
Temos um cenário perfeito para as pessoas continuarem apostando e vendo no jogo do bicho uma atividade viável, apesar de seu status de infração penal.
Outros dois fatores ajudaram o jogo a se tornar cada vez mais consolidado dentro da credibilidade popular.
O primeiro fator: utilização dos números da Loteria Federal nos sorteios do jogo do bicho.
Novamente, isso associa colabora para que o jogo tenha lisura e a banca tenha credibilidade.
O segundo fator nós citamos aqui, mas não custa reforçar: o jogo do bicho torna-se aquilo que Freire chamou de financiador de atividades culturais.
Portanto, o jogo do bicho não está associado apenas à contravenção.
Suas atividades de financiamento de bens culturais que faz bem para população, reforça a imagem positiva do jogo.
Talvez, justamente por este motivo o jogo do bicho não saiu da esfera penal menor – contravenção – para ser tipificado um crime com maior gravidade.
Além disso, o jogo do bicho é uma loteria não oficial com números impressionantes.
A estimativa é que o jogo movimente anualmente entre 1 a 3 bilhões de reais!
Indo mais à fundo: e se o jogo do bicho se legalizasse?
Vamos tirar o foco da questão moral que envolve o “jogo de azar”.
Será que se o jogo do bicho deixasse de ser uma contravenção, tudo poderia ser diferente?
Essa é uma questão complexa.
Primeiro, com a legalização, possivelmente o governo assumiria seu papel diante do jogo.
Ele seria regularizado e, consequentemente, haveria impostos envolvidos.
Assim, o bicheiro provavelmente abriria mão do seu poder elevado para dar ao governo aquilo que lhe compete.
Será que eles aceitariam?
Difícil saber!
Projeto de lei
Há um projeto de lei no senado para a legalização do jogo do bicho e outros jogos, como cassinos e bingos
O senador Angelo Coronel, relator do citado projeto de lei, afirmou que o jogo “é um costume. Jogam de evangélicos a padres, de médicos a advogados, de policiais a políticos. Uma grande parte faz uma fezinha no jogo do bicho, só que faz clandestinamente. Está na hora de a gente legalizar””.
Diante disso, os bicheiros teriam de se inscrever em editais para regulamentar sua situação com o Estado, com a obrigação de pagamento de impostos e outras obrigações legais.
Só não sabemos se os donos das bancas têm algum interesse em abrir mão do seu poder econômico e “entregar” seus negócios ao poder público.
A única certeza que temos é que, com a legalização, a arrecadação estatal será maior!
Se os abusos e os problemas decorrentes da atividade dos bicheiros reduzirão, simplesmente não dá pra saber.
E você, acha que um dia será possível a legalização do jogo do bicho no Brasil?