Revolução industrial e a industrialização do vestuário: onde a função encontrou a moda

Por Queila Ferraz Monteiro

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Este texto tem como objetivo comentar a evolução histórica da indústria de vestuário, que já nasceu como elemento significativo da constituição da Revolução Industrial na Inglaterra. Aqui estamos discutindo esta evolução a partir dos textos de Elisabeth Wilson, em sua obra Enfeitada de Sonhos e de José Carlos Durand em Moda Luxo e Economia.

O primeiro olhar sobre o texto de Wilson aponta para o aspecto mais discutido pelo pensamento culto do séc. XIX, a condição do trabalho dentro da industria. A industria têxtil deu o arranque da Revolução e, não houve literatura e pensamento teórico que escondesse a forte exploração trabalhista das mulheres neste setor. Incomodava àqueles contemporâneos que, enquanto as mulheres da sociedade burguesa se vestiam com roupas luxuosas, as operárias das indústrias têxteis eram exploradas, recebendo baixos salários, trabalhando em condições de grande insalubridade e excesso de carga horária.

Em poucos anos, a indústria inglesa do algodão dominava o mundo, tendo destruído as indústrias de algodão indígena do subcontinente indiano e devorado a matéria-prima na qual se baseava, o que implicou condições de vida e de trabalho duras pra mulheres e crianças daquela colônia.

A partir do século XVIII o tecido de algodão passou a ser usado não somente para forros ou artigos domésticos, mas também para as roupas da alta sociedade. A partir daí as técnicas de estamparia do algodão foram mecanizadas, aumentando a venda e a procura do produto.

A industrialização da lã também começou a se estabelecer definitivamente na Inglaterra, deixando de ser uma tecelagem de domínio familiar e artesanal, passando a ser usada inclusive pela alta sociedade, pois anteriormente era um tecido usado somente pelas classes mais baixas.

Quanto à tecelagem da seda, que foi sempre considerada mais luxuosa do que a lã e o algodão foram entre os séculos XVII e XVIII que a Inglaterra passou a ser importante produtor de tecidos dessa fibra. Esta industria incluía na sua mão de obra homens e mulheres dos mais diferentes níveis sociais, tais como os ricos mestres tecelões e as mulheres e crianças trabalhadoras mais exploradas. A seda sempre foi um tecido raro, difícil de ser produzido por exigir uma mão-de-obra muito qualificada.

Na cadeia produtiva têxtil as fibras mais conhecidas encontram-se na natureza: a seda, a lã, os pelos e as crinas de origem animal e os caules que permitem a extração de fibras de origem vegetal. As fibras químicas abrangem as fibras sintéticas, derivadas de produtos petroquímicos, e as artificiais derivadas da celulose.

Enquanto as fibras naturais necessitavam de um trabalho intensivo ou de grandes espaços, e por vezes de ambos, a produção dos tecidos sintéticos não necessitava nem de um tipo especial de clima, nem de uma força de trabalho abundante.

A manufatura das roupas, nas sociedades industriais do século XIX, desenvolveu-se de duas maneiras diferentes. Havia uma procura de costureiras por encomenda, de costuras delicadas e sob medida, que só podiam ser feitas à mão, e ao mesmo tempo, começava a produção em massa do vestuário industrializado padronizado, tanto nos modelos como nas medidas.

O aparecimento das fabricas de roupas reforçou a divisão entre as empresas que usavam maquinário e recrutavam mão de obra semiqualificada, e os velhos artesãos. No comércio tradicional dos alfaiates, cada peça de roupa era feita separadamente por um só trabalhador; isto era conhecido como método da peça única.


Os alfaiates haviam estado entre os primeiros artesãos independentes e tinham estabelecido as suas corporações nas cidades medievais. Eram organizações de patrões, que trabalhavam normalmente com as suas famílias, um ou dois trabalhadores experientes, contratados por dia, e alguns aprendizes.

No século XVII, surgiu a loja de alfaiate. Os alfaiates eram comerciantes estabelecidos que tinham capital suficiente para alugarem uma loja numa zona chique das cidades, para terem estoque de tecidos caros e oferecer crédito ilimitado às pessoas da sociedade que formavam sua clientela. O comércio era sazonal e os trabalhadores das alfaiatarias eram contratados e despedidos conforme as necessidades.

Na Inglaterra e nos Estados Unidos, dois grupos de trabalhadores vieram juntar-se às fileiras dos trabalhadores temporários e semiqualificados. No final do século XIX usaram trabalho dos emigrantes, especialmente Judeus. No início do século XIX as mulheres passaram de simples operária a aprendizes de alfaiates em número cada vez maior. Os trabalhadores Judeus, em muitos casos, já eram reconhecidos como alfaiates qualificados.

Foi durante o período entre 1898 e 1910, que a indústria do vestuário feito em massa arrancou de fato, tanto na Inglaterra como na América. A expansão das fabricas de confecção, no entanto não causou a falência das lojas de alfaiates ou o desaparecimento das costureiras a dias. Pelo contrário, este sistema aumentou o trabalho a domicílio.


Na virada do século XIX para o XX, os grupos feministas lutavam para acabar com a exploração salarial do trabalho da mulher e da criança, e obtiveram sucesso. A Primeira Guerra mundial fortaleceu o movimento dos Trade Boards e melhorou as condições de trabalho.

Em 1909 houve uma greve histórica na indústria das roupas onde 20 mil trabalhadores deixaram seus trabalhos. Apesar da maioria dos grevistas ser constituída por homens, foi a maior greve feminina da América. E esta greve levou a um acordo histórico que foi assinado pelos patrões, e a partir daí, as roupas femininas começaram a ser criadas também visando às necessidades de uso para o trabalho da mulher, isto, é, começaram a se fazer roupas funcionais.

Nos EUA havia um grande campo para roupas feitas em massa. As grandes distâncias geraram a possibilidade de se reproduzir e vender roupas em grande quantidade, tanto de modelos quanto de tamanhos e, para os diferentes centros.

Entre os anos 20 e 30, houve mudanças importantes na indústria das roupas, a industria de roupa conseguiu traduzir as medidas masculinas de pessoais para um padrão de roupa feita em fábrica. A moda da classe média também se desenvolveu em estilos próprios diferentes e com boa qualidade.

Nos anos 40 a produção de roupa barata e atraente estava cada vez mais ligada ao desenvolvimento de métodos de fabricação modernos que envolviam rapidez, estilo, qualidade e preço.

Durante a década de 50, com o fim do período de guerras mundiais, houve uma melhoria nas condições de vida e com isso, o crescimento de uma sociedade consumidora. Outro fator que contribuiu enormemente para o desenvolvimento da industrialização de roupas foi o surgimento do mercado voltado aos jovens estudantes.

Na metade da década de 60, quase metade das roupas industrializadas era destinada à faixa etária de 15 a 19 anos de idade. Esta mudança nos hábitos de consumo da juventude foi um fenômeno de moda e ocorreu inicialmente na Inglaterra, o que fez com que o desenho de moda inglês para o mercado de massas começasse a liderar o resto do mundo.

O crescimento do mercado de moda se deu tanto para atender exigências das faixas etárias como pela globalização, que estabeleceu um padrão de elegância a nível global. Tal crescimento exigiu grandes reformulações nas estruturas de trabalho e um grande aprimoramento no maquinário. A modernização de todos os processos industriais continuou, introduzindo o planejamento computadorizado das provisões, o desenvolveu do corte a laser e o desenvolvimento, pelos japoneses, de máquinas que bordam até em tecidos muito delicados, e hoje, até a alfaiataria de fábrica por encomenda utiliza agora pontos feitos à máquina que imitam os aspecto do ponto feito à mão.

Cadeia Produtiva Têxtil

As fibras mais conhecidas encontram-se na natureza: a seda, a lã, os pelos e as crinas de origem animal e os caules que permitem a extração de fibras de origem vegetal. As fibras químicas abrangem as fibras sintéticas, derivadas de produtos petroquímicos, e as artificiais derivadas da celulose.

Os artigos fabricados ao longo da cadeia produtiva têxtil podem ser agrupados em quatro grandes segmentos:

1 – Fios Têxteis: o fio têxtil é o produto final da etapa de fiação. Sua característica mais importante é o diâmetro ou grossura.

2 – Tecidos e panos: o tecido ou o pano é o produto final da tecelagem.

3 – Os não-tecidos: de aplicação crescente, são desenvolvidos por procedimentos de produção completamente diferentes, são obtidos pelo agrupamento de camadas de fibras unidas por processos mecânicos, químicos ou com a combinação destes. Têm uso preponderante em forrações decorativas, tais como carpetes, feltros e em produtos do tipo descartável, como fraldas, roupa de cama para hospitais, indumentária cirúrgica.

4 – Malhas ou Tricô: a tecelagem das malhas dispensa a necessidade dos fios de trama, sendo o pano produzido a partir de um ou mais fios que se entrelaçam sobre si mesmos. São feitos à mão ou a máquinas com agulhas.

5 – Confecções: constitui o produto final da cadeia produtiva têxtil vestuário. As confecções abrangem roupas de malha, vestuário e acessórios de tecidos, roupas de cama, mesa, banho, copa, sacos e sacolas para embalagem, cobertores e outras manufaturas, tais como tapetes e rendas, dentre outros.

Cabe ressaltar que, tanto o setor têxtil quanto o de confecções não são geradores da sua própria tecnologia, o que significa que os sues respectivos avanços tecnológicos são incorporados pela utilização de bens de capital.

Porém, hoje, esta imensa sofisticação tecnológica coexiste com a mais terrível exploração de trabalhadores do terceiro mundo, numa versão gigantesca, em escala mundial, do velho sistema de despedimentos e de subcontratação de serviços facçionados, ou seja, o “sistema de suor”, como nos fala Karl Marx.

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Queila Ferraz Monteiro é estudiosa de História da Moda, é consultora de design e gestão industrial para confecção e Professora de História da Indumentária e Tecnologia da Confecção dos cursos de moda da Faculdade Belas Artes, Senac Moda e Universidade Anhembi Morumbi. queilamoda@yahoo.com.br

Queila Ferraz: Queila Ferraz é historiadora de moda e arte, especialista em processos tecnológicos para confecção e consultora de implantação para modelos industriais para a área de vestuário. Trabalhou como coordenadora Geral do Curso de Design de Moda da UNIP, professora da Universidade Anhembi Morumbi e dos cursos de pós-graduação de Moda do Senac e da Belas Artes.

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