Alan Turing: o gênio da computação condenado por ser homossexual
Para somar à luta contra a homofobia, conheça a história de Alan Turing, o gênio da computação moderna perseguido por ser homossexual.
Se o estudo da história nos serve para algo é para confrontar os problemas, conflitos, desigualdades e preconceitos do presente. Assim, em celebração ao Dia Internacional Contra a Homofobia (celebrado em 17 de maio), conheça a incrível trajetória de um dos homossexuais mais notáveis de todos os tempos, o inglês Alan Turing (1912-1954).
Ainda que o nome de Turing seja automaticamente associado à teoria da computação, aos primórdios da inteligência artificial e às operações secretas britânicas durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), ele também foi uma das personagens mais injustiçadas dentro da comunidade gay.
Ou seja, além de matemático, cientista da computação, lógico, criptoanalista e biólogo teórico, Alan Turing era, antes de mais nada, humano, sendo um importante símbolo da luta contra a homofobia.
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Juventude
Alan Mathison Turing, seu nome completo, nasceu em Londres, na Inglaterra, no dia 23 de junho de 1912. Quando jovem, ele tinha uma capacidade fora do comum e, além disso, pôde estudar em bons colégios. Apesar de demonstrar habilidades excepcionais com as matemáticas, Alan não teve um grande incentivo quando pequeno – inclusive dizem ter sido reprendido por não dar tanta atenção aos “estudos clássicos”.
Não parecia, de fato, ser um jovem convencional – e não o era!
Seja como for, foi ainda adolescente, em Sherborne School, que Turing estabeleceu um forte laço de amizade com o colega Christopher Collan Morcom (1911-1930). Acima de tudo, esse parece ter sido o “primeiro amor” de Turing.
Entretanto, a morte prematura de Morcom, em fevereiro de 1930, o afetou profundamente. Como resultado, o jovem mergulhou de vez nos estudos e na pesquisa.
Alan Turing e a Universidade
Ele se manteve dedicado aos temas que o atraíam e, em 1931, ingressou no curso de matemática na Universidade de Cambridge. Após graduar-se em 1934, em reconhecimento ao seu trabalho com a “teoria da probabilidade”, Turing foi eleito para uma bolsa no King’s College.
Em 1936, Alan Turing publicou o seu artigo “On Computable Numbers, with an Application to the Entscheidungsproblem“. Nele, o estudioso apresentou um trabalho inovador sobre os limites da computação, substituindo a linguagem formal baseada na aritmética universal de Kurt Gödel por simples mecanismos formais e hipotéticos que forão então conhecidos como “Máquinas Turing”.
O Entscheidungsproblem (problema de decisão) foi pela primeira vez colocado pelo matemático alemão David Hilbert em 1928. O que Turing conseguiu provar é que a sua máquina seria capaz de realizar qualquer computação matemática concebível se ela fosse representada como um algoritmo. De tão inovador e pertinente, o seu trabalho continua a ser central dentro da teoria da computação, o que também o consolidou como precursor da inteligência artificial.
Ainda em 1936, o jovem se mudou para os Estados Unidos, onde passou a cursar um doutorado em matemática pela Universidade de Princeton (concluído em 1938) sob orientação do grande matemático Alonzo Church, que trabalhava com as mesmas questões que Turing.
Alan Turing e a Segunda Guerra Mundial
Tendo retornado ao Reino Unido, a segunda fase da carreira de Turing foi sua longa incursão na criptografia enquanto trabalhava para o Serviço Secreto Britânico durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945).
O governo britânico convocou Turing logo ao princípio do conflito, além de outros matemáticos reconhecidos, com a finalidade de quebrar o código alemão produzido pela máquina Enigma. Esse era um sofisticado dispositivo eletro-mecânico usado pelos militares alemães para codificar as suas mensagens e ordens.
A principal contribuição de Alan Turing foi a criação de máquinas, então conhecidas como “bombas”, pensadas para passar por milhares de combinações da Enigma a fim de decifrar as palavras mais comuns dentro do seu código e, assim, finalmente a chave correta do seu funcionamento.
A ajuda de Turing foi vital para o êxito da missão e a eventual vitória dos Aliados.
A homossexualidade de Alan Turing
Apesar do sucesso na carreira e projetos profissionais de Alan Turing, a sua vida pessoal esteve muito longe de ser tranquila e feliz.
Ele era descrito como um homem calmo, tímido e às vezes até mesmo desajustado (socialmente falando). Além disso, ele era assumidamente um homem gay, em uma época em que a aceitação da homossexualidade não era uma realidade. Apesar disso, a esse respeito ele não demonstrava ter nenhum constrangimento.
Em outras palavras, ainda que até hoje o ato de se assumir abertamente homossexual não seja nada fácil, já que o preconceito e a rejeição continuam muito fortes, imagine na época de Turing! Contudo, há mais de cinqüenta anos, Alan Turing se mostrou sempre seguro, determinado e bem resolvido a esse respeito. Infelizmente, seria essa firmeza que o colocaria em apuros.
Condenação e Morte
Após o fim da guerra, em maio de 1948, Turing assumiu o cargo de Diretor Adjunto do laboratório de informática da Universidade de Manchester. Foi nessa cidade que Alan Turing foi preso e chegou a julgamento em 31 de março de 1952, depois que a polícia soube de sua relação sexual com um jovem local. Afinal, ainda que pareça um absurdo, a justiça considerava a homossexualidade um crime à época.
Ele não só não fez nenhuma negação sobre o fato como, em vez disso, manifestou que não via qualquer problema em suas ações.
Desse modo, como alternativa para não ir à prisão, ele aceitou fazer o “tratamento” de injeções de estrogênio, que tinham com o objetivo neutralizar a sua libido, pelo período de um ano.
Após passado um ano da conclusão do tratamento, ele se suicidou ao comer uma maçã envenenada com cianeto. Ainda que existam outras teorias sobre as motivações e circunstâncias da morte de Turing, ela é um claro exemplo de como a homofobia é agressiva e danosa para a nossa sociedade.
O Jogo da Imitação, ou a Vida X Ficção
Apesar da injustiça da sua história, Alan Turing continua a ser exaltado como uma das principais personalidades do século XX. Não por menos, inspirou a produção do filme de 2014 “The Imitation Game”, estrelado por Benedict Cumberbatch e Keira Knightley – disponível na Netflix.
Entretanto, a sua contribuição ao conhecimento científico e à humanidade vão muito além daquilo que é retrato na cineprodução. Afinal, ele não apenas estabeleceu os fundamentos que dariam forma à relação entre os seres humanos e as máquinas criadas pelo seu próprio engenho, como defendeu a plenos pulmões que não havia qualquer constrangimento ou problema com a sua orientação sexual.
Que as suas palavras finalmente tenham o efeito desejado.
Por Mariana Boscariol.
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