– E como vai a namorada Rafael? – Rafael tem 17 anos e é meu sobrinho.
– Tá louco tio? Antes do carnaval? Nem pensar.
Oras! Por quê? Porque antes do carnaval não rola namorar? Há mil respostas que justificam, mas que acabam chegando numa bifurcação curiosa.
Rafael é um garoto tão bonito quanto tímido. Volta e meia, querendo me zoar, vem perguntado: ”Como é que se chegava nas minas tio? “Claro que além de me zoar, ele que não é bobo nem nada, quer arrancar alguma dica que ainda possa ser útil e funcional nos dias de hoje.
Para as meninas, (generalizando) o cara que é bonito não precisa abrir a boca, não precisa usar aquelas cantadas que no “projeto”, para eles, parecem boas, mas para elas, se mostram catastróficas. Para o tipo colírio (menino bonito, o boy magia) as conquistas deveriam acontecer de forma “mágica”. A conquista deveria ser como um comercial de creme dental. Rafael, apesar de todo estiloso, sofre com sua insegurança. (Pena que não é só ele!).
Continuei nosso papo:
– Recebi uma foto de um guardanapo pelo Facebook, que foi usado como “correio elegante” num bar, o recado dizia: Posso te conhecer? Se SIM dê um sorriso. Se NÃO dê um duplo salto mortal para trás. Criativo, não é?
– E funcionou tio? – Seus olhos se ascenderam, era só isso que ele queria saber.
– Como posso saber? Afinal, não basta ser bonito, nem muito menos só apresentar o xaveco no bilhete. A reação dela vai exigir uma série de novas atitudes do interessado. Só a frase do guardanapo, não garante o sucesso no fim da história.
– Mas, e a mágica dos bonitos? Não é mágica? – ele perguntou sem saber o que fazer com a dita beleza.
Sua inesperada pergunta me surpreendeu. A insegurança de quem não se sente bonito sempre parte do pressuposto de que para os colírios existe uma mágica, aquilo que faz o mundo se curvar só porque se é bonito. A pergunta do Rafael detonava esta afirmação. Sua pergunta respondia minha dúvida: a mim, que nunca fui um modelo de beleza, parecia muito mais difícil a conquista do que para os galãs. Pensava que ele, tão charmoso, não passaria por esta provação. Para ele a conquista deveria ser fácil como um truque mágico. Pelo visto não era. Colírio ou não, em comum nós tínhamos a ilusão da busca por um atalho que contornasse nossas dificuldades e nos levasse direto ao ponto.
Como tio, gostaria de dizer e lhe dar alguma informação que interessasse e respondesse às dúvidas DELE, mas percebi que não conseguia dizer nada que não passasse pela MINHA própria experiência. Não ia ter jeito, o papo ia ficar careta.
– Rafael, – meu tom ficou solene – é a dificuldade que determina o grau de satisfação. Para isso não tem atalho. Nem para feios, nem para lindos.
– Mas, não antes do carnaval, não é tio? – ele respondeu quase dizendo: “Isso não tem nada a ver comigo”. Claro que não tinha, tinha a ver com o seu tio.
O carnaval tem a promessa embutida da conquista fácil, de que todas (os) estarão lá à disposição, sem a necessidade de elaborar um plano ou uma cantada infalível. A promessa é de fazer a colheita sem a necessidade do “plantio”, como o criativo bilhete do Facebook. Eu também já tive 17 anos e me recordava de que a única coisa que importava nesta idade é: QUANTO. Quanto mais, melhor. No meio da grande oferta parece muito mais fácil encontrar aquela pessoa que vai se destacar, a tal pessoa especial. Mas, a quantidade é, de novo, um atalho em busca da facilidade de contornar a dificuldade sem precisar enfrentá-la. Como eu diria a ele que é justamente este “quanto mais, melhor” que nos engana com a irresistível promessa do prazer infinito? Como diria a ele que esta é uma promessa leviana que nunca vai entregar o prometido.
– Você está de brincadeira tio? – Ele disse em tom sério e totalmente desinteressado.
Caí na real. A quem eu estava dizendo tudo aquilo?
-Desculpe Rafael, estava me recordando de que há alguns anos eu estava envolvido neste loop sedutor, onde ao me sentir sozinho buscava mais, e ao ter mais me sentia mais sozinho. Sempre partindo da lógica de que “quando mais, melhor”.
– Legal tio. E aí? Pegava todas?
-Pegava.
– E aí? E aí?
– Aí que se passaram muitos anos, e eu sem saber como sair do loop viciado. E todos os outros que estavam nesta mesma roda me aconselhavam: “Não seja besta, nada de se amarrar”. Ao aceitar o conselho, a estonteante promessa de prazer farto e fácil se renovava. O custo para isso é a impressão que se estiver namorando, estará perdendo o melhor da festa.
-Agora estamos falando a mesma língua.
– Não estamos não. – o desapontei mais uma vez – Depois de algum tempo talvez você experimente a incrível sensação de que apenas uma garota, consegue dar mais satisfação do que a sedutora promessa da grande quantidade fácil do carnaval.
– Tio… Na boa, você está de sacanagem?
O que eu estava fazendo? Caí na real. Que conversa mais besta com alguém de 17 anos. Quem sabe quando ele tiver 25. Revirei uma gaveta e peguei um fardo de camisinhas.
– Estava de sacanagem Rafael – disse entregando os pontos. Vai lá e faça ficar divertido, fique tranquilo que quando se está afim, qualquer xaveco funciona – e lhe estendi as camisinhas.
Ele abriu um sorriso. Conseguiu uma espécie de autorização, que não tinha me pedido e a dúvida sobre namorar ou não antes do carnaval, ele só descobrirá daqui a alguns anos. Por enquanto esta certeza e as suspeitas eram só minhas.
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Por Vinícius Moura