Por que é tão difícil se relacionar? Terapeuta fala sobre o amor nos dias atuais

A terapeuta Camila Custódio explica os obstáculos para o amor nessa época de relações fluidas e conta por que é tão difícil se relacionar

Fonte: Kelly Sikkema/Unsplash

Vivemos nos conectando com outras pessoas, não só presencialmente, como também virtualmente, por meio de apps ou das redes sociais. No entanto, o fato é que está cada vez mais difícil manter um relacionamento amoroso nos dias atuais. Mas por que é tão difícil se relacionar?

Em seguida, a terapeuta Camila Custódio, colunista do Fashion Bubbles, faz um panorama sobre o amor nos tempos modernos. Continue lendo a fim de conferir!

Afinal, por que é tão difícil se relacionar?

Fonte: Canva (adaptada)

Vivemos uma época de relações fluidas, rápidas, como já dizia Zygmunt Bauman em seu livro “Amor Líquido” (2003). Dessa forma, não insistimos mais em um relacionamento quando ele apresenta algum tipo de obstáculo, diferença ou divergência. Estamos menos tolerantes, menos pacientes e dispostos a ouvir o outro.

Nesse novo momento virtual, há não apenas uma grande oferta de pessoas, como também uma pseudo-ideia de que, se aqui não deu certo, devemos ir para a próxima tentativa. Visto que temos várias opções, pensamos que não podemos perder tempo.

Só que essa pressa não nos permite aprofundar a relação. Há um desapego e as pessoas têm dificuldades de se conectar emocionalmente com o outro. Existe uma grande troca sexual, mas ainda há uma armadura emocional que impede de outro de conseguir se expressar e demonstrar sua vulnerabilidade.

Nessa nova fase que vivemos, preservamos muito a individualidade e pouco a conjugalidade. Ou seja, não estamos dispostos a abrir mão de algumas coisas em prol da relacionamento, as pessoas estão mais inflexíveis.

Sem dúvida, a individualidade é importante. Entretanto, não podemos confundi-la com o individualismo.

A individualidade remete a identidade, nossos hábitos, escolhas e vontades individuais. Então, é muito importante inclusive para a autoestima da pessoa.

Por outro lado, o individualismo sugere a individualidade de forma egoísta e egocêntrica. Não respeita a individualidade do outro, prejudicando a construção da conjugalidade, que é a vinculação entre dois indivíduos independentes para surgir o nós, o terceiro elemento da relação.

Por que é tão difícil encontrar um amor verdadeiro?

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Carregamos também muitas crenças sobre um ideal de amor romântico que foi perpetuado durante muito tempo na nossa cultura. Muitas de nós, “filhas de Walt Disney”, acreditamos que iremos encontrar um grande amor que nos compreenderá só com um olhar.

De acordo com essa ideologia, ele também saberá quase que por instinto onde nos tocar, do que gostamos ou não. Será paciente, fácil de lidar e, ao seu lado, seremos felizes para sempre.

Para nossa sorte, a Disney evoluiu seus contos. E nós também estamos aprendendo a desconstruir esse conceito, que ainda deixa tantas mulheres em estado de desilusão.

Afinal, não encontramos um amor, encontramos alguém com características que nos atraem por inúmeros motivos e, a partir daí, construímos uma relação com essa pessoa.

Uma relação não vem pronta, demanda muito investimento para construção de um patrimônio emocional solidificado. E para que esse patrimônio cresça, vai precisar de atenção constante. Eu disse atenção, não preocupação.

Amar é se permitir passar pelo desencantamento da fase da paixão. Assim, é enxergar o outro como ele realmente é, um ser não tão perfeito quanto aquele que a gente idealizou.

Para construção de qualquer relacionamento, muitas coisas são importantes, mas considero as mais necessárias o autoconhecimento e o diálogo.

E acredito que grande parte dessa dificuldade de relacionamento hoje se dá pela nossa comunicação. Temos dificuldade de comunicar o que queremos e sentimos para outro, principalmente de forma clara e não violenta.

Por que não consigo me relacionar com as pessoas?

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Acima de tudo, porque é necessário:

  • Conhecer a si mesmo;
  • Saber o que você quer em um relacionamento;
  • Descobrir até onde está disposto a ir com outra pessoa;
  • Ter clareza sobre seus desejos: o que te causa alegria, prazer, satisfação, o que te deixa em paz, o que te faz sentir segurança;
  • Da mesma forma, conhecer meus anseios, inseguranças e desconfortos;
  • Saber respeitar seus limites para poder ir comunicando isso ao outro conforme essa relação vai sendo construída.

Fácil? Talvez na teoria. Mas, na prática, nem um pouco. Alimentamos uma expectativa sobre o outro, o que é perfeitamente normal.

O problema está em não comunicar nossas expectativas e se frustrar com o parceiro por algo que ele não descobriu que desejávamos. E isso é muito comum de acontecer, independente do tempo de relacionamento.

Se for recente, como ele não percebeu o óbvio? Se for uma longa relação, como ele não sabe que isso me desagrada convivendo comigo há tanto tempo?

E a resposta para ambas é simples. O óbvio precisa ser dito, precisa ser comunicado em qualquer relação, porque o óbvio para mim pode não ser a mesma coisa para o outro.

Se você vai recebendo palavras e atitudes do seu parceiro que o incomodam, sem posicionar a pessoa ela fica no escuro e você desmotivada esperando por uma compreensão que não chega.

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Qual é a fase mais difícil de um relacionamento?

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Mas os obstáculos para o relacionamento não param por aí. Muitas pessoas ainda não têm clareza sobre seus próprios sentimentos. Ainda assim, querem que o outro a decifre, atenda necessidades que nem a própria pessoa consegue identificar.

É comum as pessoas iniciarem um diálogo com a mente confusa, as ideias desorganizadas. E, se está difícil para ela se expressar, imagine para o outro compreender.

Por outro lado, há quem tenha clareza do que sente e quer, só que possui dificuldade de comunicar ou sentir-se compreendido(a) pelo parceiro(a).

Há também aquelas pessoas que sabem, mas não comunicam pelo medo de gerar algum atrito, desagradar o outro. Dessa maneira, acabam criando um conflito interno e, por consequência, uma relação baseada em ressentimento.

Outras pessoas optam pelo silêncio, que também mata a relação. Sem contar na quantidade de pessoas que vai de relacionamento em relacionamento, sem tratar seus traumas, suas feridas. Sem o mínimo de autoconhecimento e com a autoestima fragilizada, acabam por se envolver em relacionamentos abusivos.

Conseguem perceber a importância do autoconhecimento e do diálogo para ter uma relação saudável? Bons relacionamentos demandam disposição e disponibilidade para fazer as coisas darem certo. Contudo, nem sempre as duas pessoas da relação estão no mesmo ritmo para fazer as coisas acontecerem.

É importante lembrar que não é o amor que sustenta um relacionamento, mas sim a forma de se relacionar que sustenta o amor. Muitas pessoas invertem essa ordem e acabam em relações que não frutificam, apenas alimentam o seu vazio emocional.

Mulheres e os relacionamentos amorosos

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Outra coisa que acho importantíssimo esclarecer aqui é que, ainda hoje, culturalmente nós mulheres carregamos o peso da responsabilidade pelo sucesso ou pelo fracasso da relação.

Vejo isso acontecer muito. Independente da idade da mulher que busca atendimento terapêutico, ela assume para si que o relacionamento não deu certo por algo que ela fez ou deixou de fazer. E isso precisa ser desconstruído urgentemente.

Um relacionamento é de responsabilidade das duas pessoas envolvidas. Não devemos buscar culpados e sim responsáveis pela construção saudável da relação.

Se ela não evolui e você sai com a consciência tranquila de que fez a sua parte, precisa entender que provavelmente o outro não estava preparado emocionalmente, pelas razões dele, para continuar nesse relacionamento.

Não assuma para você as questões que são do outro. Mais uma vez, o autoconhecimento se mostra importante.

Mas também não estou dizendo que não há características em você que interferem na construção do relacionamento. Se acaso você vive reproduzindo ciclos que te fazem sofrer, vale a pena trabalhar esses pontos, olhar para isso com um atenção e gentileza.

Nós não mudamos pelo outro, mudamos em respeito a nós mesmos. Ninguém muda ninguém, mas quando eu mudo, o outro responde à minha mudança.

Não construo intimidade com o outro se não tiver construído intimidade comigo primeiro. A conexão consigo mesma é a conexão mais importante que existe.

Conclusão

Só o amor não basta para ter uma relação. E ainda precisamos desconstruir o que nos foi internalizado como amor.

Há muitos atravessamentos que nos impedem de ter uma relação saudável. Há pessoas que aprenderam que ciúmes é amor, manipulação é amor, controle é amor, chantagem emocional é amor… E isso não é amor.

Um relacionamento demanda equilíbrio, ele não deve ser sofrido demais e ele nunca será fácil demais. Com autoconhecimento, diálogo baseado em uma comunicação não violenta, uma escuta sensível, disposição e disponibilidade, com toda a certeza estamos caminhando para deixar essa relação mais leve e saudável.

Sobre a colunista

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Camila Custódio é idealizadora do Consultório Emocional – @consultorioemocional nas redes sociais. Camila é Assistente Social, Terapeuta de Família e Casal, Terapeuta Relacional Sistêmica, Psicanalista e Coach. Além disso, é Especialista em Gestão da Emoção e Consultora em Desenvolvimento Humano.

Escreve sobre saúde emocional, relacionamento e empoderamento feminino para sites, revistas e blogs. Atende pacientes online de todo o Brasil e do exterior.

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Camila Custódio: Camila Custódio é idealizadora do Consultório Emocional - @consultorioemocional nas redes sociais. Camila é Assistente Social, Terapeuta de Família e Casal, Terapeuta Relacional Sistêmica, Psicanalista e Coach. Especialista em Gestão da Emoção, Consultora em Desenvolvimento Humano. Escreve sobre saúde emocional, relacionamento, empoderamento feminino para sites, revistas e blogs. Atende pacientes online de todo o Brasil e do exterior.

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