Moda Uniban Taliban

Fui almoçar com amigos e uma de nossas conhecidas usava um vestido de muito bom gosto, solto e curto embalando seu lindo corpo e celebrando a chegada do verão.

Ao vê-la chegar ao restaurante lhe falei em uma frase espontânea resultado de uma cadeia de significantes dos últimos fatos registrados em minha memória – é melhor que você não passe perto da Tuliban (parodiando a relação que fizeram entre a Uniban e o Taliban)! Todos rimos, mas tal frase foi motivo de uma discussão muito séria durante todo nosso almoço.

Na quinta-feira, dia 22 de outubro de 2009, uma estudante de turismo da Universidade Bandeirantes (Uniban) em São Paulo foi pivô e vítima de uma agressiva manifestação de intolerância e falta de respeito aos direitos individuais, por usar um curto e justo vestido rosa-choque.

O estabelecimento de ensino parecia mais um estádio de futebol em dia de final de campeonato e a moça parecia desfilar vestida com a camisa do time adversário. Mais de 700 alunos, professores e funcionários gritavam palavras de baixo calão e a mesma teve que sair escoltada por policiais militares. Veja o vídeo publicado no Youtube .

Estudante humilhada na UNIBAN – vestido rosa

É muito difícil entender e aceitar uma atitude preconceituosa de jovens alunos, professores e funcionários amparada institucionalmente por uma universidade privada que tomou a decisão de expulsar a aluna após uma sindicância. Todos ficamos chocados ao assistir aos vídeos na internet e às matérias publicadas nos principais veículos de comunicação. Eu me perguntei várias vezes o que motivaria tamanha agressão coletiva e expressão de ódio e indignação provocado por uma pessoa que usa um vestido pink tão curto e apertado em uma universidade “privada”, na cidade mais cosmopolita da América Latina, em um país do carnaval, funk, bundas, mulher melancia, o país de maior consumo de  silicone, que se diz democrático e não-bélico.

O Brasil onde “Bruna Surfistinha, quem diria, também conseguiu entrar na Lei Rouanet. O ministério da Cultura acaba de aprovar a captação, via renúncia fiscal, de 2 milhões de reais pra a produção da peça Doce Veneno, inspirada na vida (e, digamos, na obra) da ex-garota de programa Raquel Pacheco, a Bruna Surfistinha.” ( Fonte: Revista Veja)

Eu tenho presenciado outras mulheres usando vestidos similares, míni-saias, micro-shorts em tantos lugares comuns em São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Miami, Nova Iorque, novelas com dimensão nacional dentre outros lugares e as reações das pessoas não são nada parecidas com a catarse ocorrida naquele dia na tal universidade. Até mesmo um antigo presidente do Brasil foi flagrado com uma modelo que usava vestido curto e sem calcinha.

Não há dúvida de que ações preconceituosas expressas por várias formas de agressões físicas e psicológicas têm sido apontadas com muita preocupação. As defesas aos ataques às minorias como negros, gays, mulheres, deficientes, idosos, grupos étnicos e religiosos, bem como assédio moral nas corporações são amparadas por leis e novas jurisdições, entretanto não sabemos ainda lidar com situações de “Bullying”, um termo inglês que descreve atos de violência física ou psicológica praticados por um grupo de indivíduos, de forma intencional e repetida com o objetivo de intimidar e humilhar aqueles incapazes de se defender. Tais fatos, mais comuns do que imaginamos, resultam em sequelas físicas e psíquicas nos agredidos e tem sido tema de discussão entre profissionais da educação e saúde.

Na situação da aluna da Uniban, autores de artigos semelhantes relacionaram a universidade com o Taliban (Tuliban).  Podemos analisar o fato pela visão da agredida e também do agressor (um grupo de 700 pessoas composto por alunos, professores e funcionários) bem como pela direção da Uniban que tomou a decisão de expulsar a aluna, fazendo transparente o tipo de estabelecimento de ensino  e seus valores, que não corresponde a uma instituição privada estabelecida em um país que “garante” constitucionalmente o direito de todos os cidadãos de ir e vir. Os agressores não podem justificar seus atos pela moral e ética, pois demonstraram em sua atitude e vocabulário desconhecer questões de ordem moral e ética.

O fato é que o resultado deste ato de intolerância não é bom para ninguém. Nem para a agredida e tampouco para os agressores e muito menos para nós espectadores desta manifestação pública grotesca. Se nos colocarmos no lugar da agredida podemos especular muitas sequelas psíquicas provocadas pelas agressões e pela decisão da instituição de expulsá-la. Quanto aos alunos e professores não podemos afirmar que todos aderiram à catarse coletiva (identificação com os agressores), entretanto ficará para sempre em seus currículos a associação de ter sido graduado ou trabalhado em uma instituição de ensino que foi conivente e palco de um ato violento e preconceituoso desproporcional.

Talvez, se fosse ensinado na instituição em questão, atos civilizatórios, políticos e democráticos, os alunos agressores poderiam se utilizar dessa mesma energia para repudiar contra a corrupção e falta de ética em nosso congresso nacional, que nem um vestido longo seria  capaz de cobrir nossas vergonhas.

O que eu posso dizer é que rosa-choque é tendência no verão. Preconceito e violência NÃO.

Por Carlos Alberto Alves e Silva

Carlos Alberto Alves e Silva: Psicanalista e economista, com pós-graduação em Administração pela USP e Marketing pela ESPM. Tem MBA em Gestão Internacional pela Thunderbird School of Global Management‚ Arizona‚ USA e formação nas áreas de Psicologia e Filosofia.

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