Outro dia escrevi sobre a agradável experiência de trazer a atmosfera do almoço de sexta-feira para as quartas-feiras (thanks god it’s Wednesday!). Hoje decidi partilhar uma outra experiência que me fez refletir sobre a frustração de almoçar sozinho mesmo na companhia de alguém.
Uma amiga me ligou e me convidou para almoçar e seu entusiasmo me contagiou. Era uma quarta-feira e eu estava disposto a repetir meu “happy Wednesday”.
Minha amiga insistiu muito para que eu fosse, dizendo que gostaria de me apresentar pessoas incríveis, animadas, que tinham tudo a ver comigo. Eu larguei tudo o que estava fazendo e fui ao grande encontro. Quando cheguei ao local pensei ter errado o restaurante, pois não os localizei no primeiro momento. Era um restaurante japonês com grandes divisórias entre as mesas que eram super, hiper baixas e todos nós, sentados quase no chão, com as pernas cruzadas ou entrelaçadas.
Não parecia um ambiente muito animado, pois estavam em silêncio, mas cheguei com tamanha empolgação que pensei ter interrompido a concentração. Cumprimentei minha amiga e me apresentei aos demais. Não precisei perguntar qual era o assunto, pois não me pareceu ter alguma coisa relevante ou escrachada em discussão.
Estavam todos tão envolvidos com seus brinquedinhos – celulares e blackberries – que nem perceberam o que eu pedi para comer ou beber. Tentei propor um assunto para discussão, entretanto as respostas eram vagas e sempre interrompidas: “Sorry, mas esta ligação eu tenho que responder”; olhando para tela do blackberry um deles balbucia: “Eu já passei três mensagens e este povo não responde”; “Oi, como vai? Eu estou almoçando, mas logo retorno”.
Por alguns instantes pensei o que eu estava fazendo lá, mas decidi não me frustrar e observar o comportamento de cada um cavoucando seu blackberry ou fazendo ligações como se estivessem comprando e vendendo uma empresa na Turquia.
Já li muito sobre o impacto dos blackberries, PDA, palm top, iphone, laptops, pagers, celulares na vida dos executivos. Em 2006 uma renomada empresa internacional de recrutamento de executivos, Korn & Ferry fez um estudo com 2,3 mil executivos pesquisados em 75 países e concluiu que quatro, em cada cinco executivos no mundo, estão permanentemente conectados ao trabalho por meio de aparelhos móveis.
Vício ou virtude? Enquanto muitos criticam dizendo que a tecnologia digital e móvel acentuou os vícios no trabalho (workaholic – palavra em inglês originada de alcoolholic (alcoólatra) para designar pessoas viciadas em trabalho), autismo, atitude anti-social; por outro lado temos os defensores de que a qualidade de vida do executivo melhorou muito, possibilitando-o mais mobilidade, por exemplo, estar com a família sem se desconectar.
Este é o ponto de minha discussão: estar com…. sem se desconectar.
Para o psicanalista Inglês Donald Winnicott: “Assim, a base da capacidade de ficar só é um paradoxo; é a capacidade de ficar só quando mais alguém está presente”. O trabalho de Winnicott me reporta a atitude das crianças enquanto estão brincando na presença da mãe. Algumas necessitam o tempo todo de atenção e ficam sempre inquietas mostrando o que estão fazendo, enquanto outras brincam quietinhas e de vez em quando, olham para assegurar se a mãe está presente. Este processo implicará no amadurecimento psíquico-emocional do indivíduo.
A impressão que eu tenho das pessoas que não podem prescindir de seus eletrônicos, é que não desenvolveram a capacidade de ficar só e não conseguem também estar na presença do outro para uma relação amadurecida, desta forma necessitam sempre estar conectadas, mostrando que estão fazendo algo de muito importante. Talvez precisem mostrar que são importantes, para alguém.
Por Carlos Silva