Um amigo, Sergio Araújo, me indicou essa matéria do Blog Modices, que achei simplesmente perfeita. É uma crítica bem realista, que traduz, o sentimento de muitos consumidores quando vão ao shopping, inclusive o meu, mostrando que a crise na moda vai além da crise econômica. Seguem alguns trechos, mas, vale a leitura da matéria na íntegra.
As marcas brasileiras e o famoso “mais do mesmo”
Existe uma máxima que rege quase todos os mercados e todos os tipos de crise econômica: se você não for criativo, você morre. É durante uma crise que o consumidor para e analisa como o seu dinheiro deve ser gasto de forma mais responsável – e como ele pode gastar menos, sendo igualmente feliz e realizado. (…)
É bem simples. Você tem um produto e ele tem um valor percebido pelo cliente. Se o preço cobrado é mais alto que o valor percebido, a compra do seu produto configura um mau negócio. O consumidor não quer saber se a crise chegou para você também, dono de marca de moda, ele está repensando como utilizar melhor o dinheiro que sobra no mês e não quer arriscar fazer maus negócios. Eu não vou pagar R$300 pelo mesmo vestido que eu comprei no ano passado por R$180 (fato verídico relatado por nossa editora) e eu realmente não me importo se esse preço é porque conta de luz da loja aumentou – a minha também aumentou.
O que as marcas de moda brasileiras parecem não ter percebido ainda é que o seu consumidor mudou, mudou muito. Não só porque ele lê blogs e compra online – o que aumenta a concorrência para a sua marca de forma inimaginável. Mudou porque ele precisa ser convencido, o tempo inteiro, de que a sua marca e os seus produtos vão agregar algum tipo de valor para ele. Não adianta colocar na vitrine o que a menina da novela usa, não adianta fazer campanha com modelo famosa, não adianta gastar milhares de reais num catálogo de papel, não adianta repetir o que você vem fazendo há anos porque não vai mais dar certo. Você não está mais nos anos 90, Dorothy.
O mundo mudou, esvaziando os shoppings e enchendo as feiras. As pessoas já entenderam que quando elas pagam o preço pelo vestidinho de poliéster dentro da loja do shopping, elas estão pagando o aluguel da loja, a comissão da vendedora, o frete do tecido vindo da China e 80% de lucro sobre a unidade do produto final. Nada disso vale a pena se o que você oferece a seus clientes é apenas um vestidinho (que ele já viu, já teve, e sabe que vai estar com 70% off na próxima liquidação).
E se você tem a esperança, de que “quando a crise passar“, nós mulheres voltaremos às lojas felizes e radiantes com cartões de crédito em punho loucas pra comprar blusa de poliéster por 500 reais, pode começar a mudar de ideia. Consciência é um caminho sem volta.
Na Animale: manequins, ETs ou humanos impossíveis? A Topshop recentemente teve que tirar os manequins extremamente magros das suas vitrines – Crise na Moda
Basta uma ida ao shopping para ter a sensação (clara) de que nada daquilo que está nas vitrines e nas araras nos representa. Conversando com pessoas próximas, é possível ver o como essa reação tem sido cada vez mais comum e de que as marcas simplesmente não estão acompanhando a nossa evolução. “Para quem são essas roupas?” – foi a pergunta levemente indignada de uma de nós dentro de uma loja, que foi jogada em um grupo no whatsapp e desencadeou um monte de mensagens que diziam “há muito tempo não compro nada”, “só tenho achado roupas legais em marcas independentes”, “tudo tem me vestido muito mal, será que sou eu?”, “tenho preferido gastar meu dinheiro com comida e decoração”.
É como a Carla gosta de dizer: nessa crise, o dinheiro está trocando de mãos. Temos sim um dinheiro (mesmo que pouco) para gastar com nós mesmas, ainda temos vontade de comprar roupas, ainda temos desejos de tendências e de objetos de/da moda. Mas temos outros desejos consumistas também como um quadro novo para casa, um bom vinho, uma viagem no fim de semana… E isso tudo significa que se a ida ao shopping não “rendeu frutos”, o dinheiro que seria gasto com o seu vestidinho, vai ser gasto num jantar com as amigas.
Se o que você oferece a sua cliente é uma roupa sem personalidade, com qualidade medíocre, preço mais alto que o valor percebido, modelagem padrão feita nas coxas, conceito anos 90, tendencinha comprada aos lotes na China e atendimento pífio, você não pode esperar que ela compre – que ela escolha comprar com você.
E não se engane, dono de marca de moda, não adianta facilitar o pagamento. Pode parar de achar que a sua cliente não está comprando suas roupas porque está sem dinheiro. Ela só não quer mais comprar de você.
Veja matéria completa aqui.
A Folha também publicou recentemente uma matéria sobre o assunto: Para estilista, a moda enfrenta crise no país e no exterior:
“Especialista em tendências, a holandesa Li Edelkoort lançou, em Paris, no estúdio Trend Union, um manifesto antifashion, em que detecta o fim da moda como a conhecemos. Ela entende dez razões para o sistema da moda estar obsoleto, entre ela a produção: “Na busca por acordos mais vantajosos, empresas de grande difusão e até e até marcas de luxo confiaram a fabricação de seus produtos a trabalhadores mal pagos, que vivem em condições sub-humanas.” Leia mais aqui.
Para mim a origem da crise é algo muito mais profundo, pois acredito que nossa sociedade passa por um momento de enorme transição. Para Edward F. Edinger, no livro Ego e Arquétipo, estamos passando por uma reorientação psicológica coletiva equivalente em magnitude ao surgimento do Cristianismo das ruínas do Império Romano. Essa mudança violenta provocada por essa grande transição cultural provoca um enorme sentimento de falta de sentido que é uma constante nas sociedades pós modernas, crise esta que também se manifesta na Moda.
Veja mais em:Por que consumo só, não sacia? A busca de significado em nossa vida em uma sociedade de transição.
Por Denise Pitta