Dinheiro, quem te quer?

Encontrei uma lâmpada mágica semi enterrada na areia. Pulei de alegria. Será? Pensei. O formato era de uma daquelas lamparinas antigas do personagem Aladim. Puxei a camiseta e esfreguei até dar lustro. E não é que começou a sair uma fumaça e do meio da fumaça surgiu um gênio que se apresentou com o nome de Marcos. Cabelos brancos, gordinho…

Só podia ser meu dia de sorte. Contei a ele que estava desapontado com uma grande perda em dinheiro, um negócio mal feito que acabou em prejuízo. Lógico que nisso já estava desenhado qual seria meu primeiro pedido. Gênios não são para isso? Oferecer pelo menos três desejos? Engano meu, não foi assim. Diferente do que esperava, ele queria mesmo era conversar:

– Você já não se lembra, mas houve um tempo em que o valor estava nas ideias, no talento.

Marcos, esse gênio carente, queria me convencer com diálogo de que minha aflição em arcar com o prejuízo era muito menor do que eu pensava.

– Não me lembro mesmo – Respondi decepcionado, meu problema era o valor perdido, não tinha interesse algum numa história antiga de que eu nunca tinha ouvido falar.

– Acontece que sua aflição está justamente nisso, a mistura de talento com dinheiro acabou se tornando uma enorme confusão.

Com esta afirmação ele conseguiu chamar minha atenção.

– Como é isso?

– Tempos atrás, você olhava para aqueles tocos de madeira e, naquilo em que todos viam, mas nada enxergavam, você imaginava uma cadeira, um aparador ou um entalhe de uma mesa…

Entendi de imediato que ele queria me dizer que a “madeira” era apenas uma matéria qualquer esperando uma forma, e que este exemplo poderia ser aplicado em todas as outras coisas, bastava aliar o talento que cada um possui. Seja de construir paredes, fazer um filme, negociar, contar histórias, pintar quadros, administrar… Esse é o verdadeiro valor.

– A maioria das pessoas olha para aqueles pedaços de pau e nada imagina, senão uma grande fogueira. Você, pelo contrário, via uma estátua, um aplique ou um belo banco. O pedaço de madeira não era nada, mas a cadeira tinha uma utilidade, uma beleza e ergonomia que despertava atenção e o desejo.

– Penso que seja assim com cada pessoa, não é mesmo? Outro alguém pode olhar para a terra e enxergar ali um grande pomar, uma horta… Eu olho para a terra e vejo só terra.

– Imagine então esta pessoa que plantava e interessava-se pelas suas cadeiras. Ele te apresenta beterrabas, alfaces, batatas… Como trocar cadeiras por estas coisas? E quantas cebolas equivalem a uma cadeira?

– Não foi assim o começo da era das barganhas? – completei seu raciocínio.

– Isso mesmo. Em pouco tempo ficou inviável ter tantas batatas e nenhum frango. Porém, antes de chegar nisso, queria que notasse que o interesse estava no talento, nas ideias e nas soluções que alguém, ao observar qualquer coisa na natureza e ao agregar seu dom habilidoso, tinha de transformar o comum num produto ou serviço que encantava. Sejam as frutas, pintura, tecidos ou cerâmica.

– Até aqui entendo perfeitamente.


Foto: Casa Abril

– Para solucionar o problema das trocas e dar mais liberdade a quem só tinha batatas e que queria frangos ou cadeiras estipularam um preço. Este preço foi representado por uma unidade de valor que se passou a chamar dinheiro.

– Ufa! Até que enfim ouvi a palavra mágica…

– Pois é, dinheiro! Com a habilidade pessoal para fazer negócios e acumular o dinheiro, que era facilmente trocado por qualquer coisa que se quisesse. Ele, o Sr. Dinheiro, acabou se tornando a grande celebridade.

– E foi o que eu perdi – complementei com tristeza.

– Aqui é que está a confusão que tinha mencionado antes.

-Onde?

– O dinheiro é uma conseqüência de seu próprio valor, valor que você tem como pessoa.

– Está ficando ainda mais difícil.

– Vamos recapitular: a madeira sem forma que se transforma num móvel. Este é o valor. A habilidade em cultivar a terra de onde dela se tirarão grãos e frutas. Este é o valor.

– E o que eu perdi? E o dinheiro que perdi?

– A quantia que você perdeu não causa esta angústia, o que a causa é o fato de você, momentaneamente deixar de acreditar na sua tão natural habilidade.

– Agora que não entendo mesmo… Dinheiro não é importante?

– Seu investimento e angústia não pode se concentrar no dinheiro que é apenas uma conseqüência das suas ideias, (ideia que transforma madeira em móvel) o verdadeiro valor está no que você fez para conseguir produzí-lo.

Comecei a chorar, quando ele diria para que eu fizesse os três desejos?

– Entende agora que não está se lamentando porque perdeu dinheiro?

– Não, como não? Claro que perdi.

– Você se lamenta porque deixa de acreditar no talento e dons que são fundamentalmente o verdadeiro valor que você representa. Se apegar à ilusão do valor registrado na cédula apenas te diminui.

Parei com as lamúrias, afinal, fez sentido tudo que ouvi. Não quis fazer o comentário decepcionante de que o gênio que eu esperava era a figura mítica dos contos de fadas que servia generosamente a seu senhor. Acabei me conformando – dinheiro que se ganha ou se perde não é um acaso (como loteria). Fazer dinheiro não é sorte (talento e trabalho). Nos contos modernos, o gênio não é aquele que concede desejos, bem diferente disso, é o que ajuda você a se desenvolver.


Foto: Gato Fucsia

Crônica feita a partir de discussões com Marcos de Santis do Instituto Humanae.

Por Vinícius Moura

Foto de abertura: Um dedo de prosa

Vinicius Moura: Empreender tem sido minha vida e escrever é o que me eleva. Os assuntos são totalmente aleatórios.

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