Você prometeu a todos – e a si – solenemente que faria uma dieta. Entretanto… o jeito era comer escondido. Mas, afinal, que razão há numa promessa destas?
Investigo, me frustro e sinto-me um fracasso porque mesmo sob uma promessa não consigo cumprir e, no fim, chego à conclusão de que não tem mesmo razão – razão alguma. A promessa feita à mim mesmo já havia sido feita outras tantas vezes. Não somente sobre a gula, posso citar uma imensa lista de juras sem saldo. Emagrecer era, neste currículo, apenas uma pequena parte aparentemente fácil de ser cumprida.
Para que o compromisso fosse algo realmente sério, prometi publicamente, não apenas à mim mesmo, numa espécie de jura secreta. Isso deveria fazer muita diferença, porque outras tantas vezes usei descaradamente da segurança do meu segredo para “deixar prá lá” e quebrar sem culpa a promessa que “nada prometia”.
Resolvi, então, observar qual o verdadeiro motivo das promessas não honradas. Uma causa existe, ainda que eu não a conheça. Suspeitar da existência de um motivo real e não somente encontrar uma razão fria para uma decisão que precisa ser reforçada por uma promessa, já é um grande avanço. Considere isso para suas questões e chegará à conclusão de que sempre encontra desculpas para deixar de fazer tal coisa, mas poucas vezes tenta-se descobrir quais foram os motivos verdadeiros ou as emoções que levaram à situação atual.
Razões se justificam na própria superficialidade do cotidiano. Por exemplo: farei dieta para chegar ao peso adequado, ou porque o excesso de gorduras pode prejudicar a saúde. Estas poderiam ser as razões. Sim, verdadeiras! Mas não são fortes o suficiente para manter firme a promessa. Se não tenho uma razão suficiente para melhorar o que me parece inadequado, devo descobrir um motivo mais profundo que me faz prometer o que não tenho força para cumprir.
Dando um novo ângulo à questão, verei a promessa como a possibilidade de ser apenas uma metáfora. Esta metáfora é como uma tentativa do inconsciente para dizer algo à razão que até aqui se debate confusa.
Antes que você se assuste e considere uma “viagem”, explico: Para alguém que já fez tantas promessas solenes, a maioria solenemente não cumpridas, resta a observação de que parece haver algo mais que um resultado frustrante que envergonha. Deve haver algo maior do que o prazer de fazer promessas e se passar por um tolo que não cumpre o que diz. É aqui que me leva a refletir: qual o motivo? Qual a metáfora?
Claudia Leite via Casa do Axé e Mel Domezi
O motivo pode ser um sistema de trocas que fazemos desde que nascemos sem sequer tomar conhecimento, um movimento automático. Um vício infantil. Você se lembra de quando era criança e sua mãe lhe obrigava fazer a lição de casa para depois ser recompensado com o direito de brincar, ou comer um doce? Ou a proposta: se você se comportar Papai Noel lhe trará um presente. Concluindo: diante de uma condição de “sacrifício” o resultado seria um prêmio, sendo que a motivação do prêmio deve ser sempre maior do que o sacrifício. É só assim que você aceita carregar o “fardo”.
As razões que tenho para deixar a compulsão é uma promessa implícita de que a vida será melhor sem ela. Outra tradução para isso pode ser: a busca pela felicidade. Como se a felicidade pudesse ser um lugar alcançável. Não é! É um percurso e não um destino ao qual se chega. A ilusão de que é um lugar que se alcança, obriga sempre a fazer promessas de troca para – em compensação do meu sacrifício – receber o prêmio. No fim, serei mais feliz. Deu para entender a mesma mecânica do “depois do estudo você poderá tomar sorvete”. Ou, no meu caso, comer a vontade!
Até aqui percebo que minhas razões não têm sido boas o suficiente para que eu faça a troca. A única forma de deixar o que me dá prazer imediato (a gula) é uma forte promessa de que meu prazer será maior ou mais duradouro no futuro. Em outras palavras: serei mais, muito mais feliz.
Agora o verdadeiro “x” da questão: ainda que meu estado atual não esteja tão adequado quanto eu julgo que poderia estar, eu conheço perfeitamente as responsabilidades que este modelo me exige. É mais ou menos assim: eu tenho um rendimento de X por mês, e gostaria (e creio ter capacidade) de ganhar X + X. Para obter o X que eu ganho, tenho que cumprir tantas horas por dia, tenho atribuições conhecidas para minhas tarefas, sou cobrado por um tanto de trabalho. Estas são todas as responsabilidades que preciso ter para receber o valor que recebo hoje. Conscientemente gostaria de receber o dobro, mas para tanto tenho que assumir novas responsabilidades. Tenho que me atirar no desconhecido, talvez voltar a estudar e assumir muito mais atribuições do que tenho feito até aqui. É justamente esta dedicação adicional que agregará novo valor ao meu ganho.
Voltando à dieta, aprecio os alimentos como um prazer imediato. Como meu salário, o atual um X. É a impressão confortável e segura em conhecer seu sabor, seu cheiro e a sensação calma de uma ansiedade satisfeita. Sei que a gula me deixou fora de forma e bem acima do peso ideal. Mas, sou seduzido pela compulsão e tranquilidade que a comida me dá. Esta tranquilidade também me permite que eu seja um relaxado com exercícios – porque caminharia por 40 minutos se na sequência comerei 400 gramas de chocolate? Sei também que as pessoas que se aproximam de mim têm uma aparência como a minha e invariavelmente apreciam da mesma gula, dos mesmos gostos.
Deixar a compulsão pelos chocolates e todos os outros doces é assumir novos compromissos. Implica em uma nova atitude, dentre elas, a de remodelar a silhueta tornando a aparência mais esbelta, o que alavancará a auto-estima e agregará muito mais disposição.
Via Cyber Diet
Até aqui parece tudo perfeito. Mas, veja um exemplo: o meu rol atual de amigos, que como eu, são todos desencanados com a aparência, deixará aos poucos de ser interessante para mim, eles não serão mais inspiração para meus novos desejos. Não se trata de abandonar os velhos amigos, mas de uma mudança natural de interesse. Contudo, as novas amizades, me aceitarão? Serei um ex-gordo num grupo que me apontará para criar piadas? Isto é como o valor de X + X que me cobrará uma responsabilidade que ainda não conheço.
O que tudo isso quer dizer?
Não emagrecer é mais fácil do que as promessas do novo paradigma, porque no meu estado atual as regras e responsabilidades são conhecidas. Enquanto que a promessa de “um mundo melhor” vai exigir atitudes e compromissos que não sei se consigo cumprir e isto gera medo. Este pode ser o verdadeiro motivo de quebrar o prometido: a insegurança de arcar com novos compromissos.
Contraditório, não?
Você promete e jura que quer tal coisa, mas se sabota com medo da felicidade (e da responsabilidade) que o novo modelo promete e vai te cobrar. O prazer fica sendo a “possibilidade” de um dia com sorte alcançar o que poderia já ter sido alcançado ontem, se não fosse é claro, a dúvida envolta no medo implícito em amadurecer, caso contrário porque haveria de prometer?
Reflexões através das aulas Junguianas de Marcos de Santis no Instituto Humanae.
Imagem via iG Estilo
Imagem de abertura via Plástica e Beleza
Por Vinícius Moura