O homem das cavernas, na pré-história, já observava o universo, tentando compreendê-lo: o desenhava e pintava, principalmente o caminho do sol e o céu noturno, representando-os nas paredes das grutas e paredões de serras, como existem em tantas pinturas rupestres, no mundo e também aqui no Brasil.
Questionamentos sobre a origem do universo estiveram presentes em todas as grandes civilizações antigas, intensificando-se na Grécia dos grandes filósofos, quando chegou a ser levantada a ideia do átomo.
É da essência do homem tentar entender a natureza, ele deseja dominar suas forças e criar como ela.
Para Vilém Flusser, no fundo, a ciência é um método para descobrir o Deus judaico-cristão ‘por trás dos fenômenos’ e a técnica é um método para produzir o reino desse Deus sobre a Terra (…). A motivação da ciência é estar de posse da natureza descrita e calculada, no sentido de elevar o saber ao poder.
Mas, e se for o contrário? Em uma visão filosófica de Edward F.Edinger “ o mundo não existe enquanto não houver uma Consciência para percebê-lo”, descreve ele no livro Ego e Arquétipo.
Será você o universo se auto observando?
Nesta direção, muitos estudos vêm sendo realizados, e, recentemente, cientistas provaram que a realidade não existe até que a vejamos, pelo menos a nível quântico, como demonstra estudos realizados por físicos na Universidade Nacional da Austrália.
Já para o Dr. Amit Goswami , em Janela Visionária, “ a finalidade do Universo é justamente manifestar criativamente as ideias da consciência. (…) A manifestação é necessária para que a consciência ‘veja’ a si mesma e sua ideias. (…) Para ele, “não podemos fugir ao fato de que o mundo que nós conhecemos é construído para (e, portanto, de modo a ser capaz de ) ver a si mesmo.”
Nós seres humanos, desde os primórdios sentimos necessidade de registrar nossa existência, seja numa parede rupestre, numa pirâmide egípcia ou no seu perfil do Instagram
Flusser explica que a imaginação por si só não é suficiente para criar imagens. Aquilo que é visto (o fato, a circunstância) deve ser fixado e se tornar acessível para outros. Deve ser codificado em símbolos, e esse código deve ser alimentado em uma memória.
Rumo a essas reflexões, Flusser descreve: “Escrever é um gesto importante, porque não só articula como também produz aquele estado mental chamado de ‘consciência histórica’”. A história começa com a invenção da escrita, não pela razão banal frequentemente sugerida de que a escrita nos permite reconstituir o passado, mas pela razão mais pertinente de que o mundo não é percebido como um processo, “historicamente”, a não ser que alguém dê a entender isso por meio de sucessivos símbolos, isto é, por meio da escrita.
A diferença entre pré-história e história não é o fato de termos documentos escritos que nos permitam acompanhar esta, mas o fato de que, durante a história, há homens letrados que experimentam, entendem e avaliam o mundo como um “acontecimento” (becoming), enquanto na pré-história esse tipo de atitude existencial não era possível. Se a arte de escrever caísse no esquecimento ou se tornasse subordinada à criação de imagens (…), a história, no sentido estrito do termo, não existiria mais. ”
De certa forma, em meu entendimento, estas reflexões de Vilém Flusser em O Mundo Codificado, têm a ver justamente com a tomada de consciência.
Não será por essa necessidade de consciência e de ver a si próprio que é tão prazeroso registrar momentos da nossa vida nas redes sociais? Mais que para mostrar aos outros, é o desejo de tomar consciência da própria vida e daquilo que amamos, desejamos e fazemos. .. Tudo isso é registrado nas mais inocentes imagens que compartilhamos em nossa time line.
Antes podíamos nos ver no espelho, estáticos, em um momento de observação; agora podemos nos ver vivendo e até morrendo, como em alguns casos, de pessoas que filmaram a própria morte.
O homem é o único animal da natureza que tem essa necessidade e desde os primórdios desenvolveu ferramentas para registrar o mundo à sua volta e transferir conhecimento.
Antes & Depois: Facebook, antes, na pré-história, Facebook hoje, na sociedade contemporânea
Para Carl Jung, na verdade, a consciência é a necessidade de Deus ver a Si mesmo através dos olhos do homem. Deus precisa de nós, a fim de tornar-se presente na consciência.
O primeiro livro da Bíblia, o Gênesis, assim se inicia: “No princípio, Deus criou o céu e a terra: a terra, porém, estava informe e vazia e o espírito de Deus pairava sobre as águas…”.
Bela metáfora do momento original da criação da matéria, em que podemos entrever no texto poético, escrito há tantos mil anos, algo como a antecipação das pesquisas científicas mais modernas, com seus bósons conferindo massa à energia… Por que, o que é o espírito de Deus, senão energia pura?
Ainda imaginando um interlúdio entre ciência e espiritualidade, recentemente foi anunciada à humanidade a confirmação da existência de uma partícula subatômica, identificada com quase absoluta certeza como o bóson de Higgs.
Em essência, o campo de Higgs é como uma gosma pegajosa que existe em toda parte. As demais partículas, ao atravessá-lo, sofrem resistência. E com isso ganham suas massas. Cada partícula interage de forma diferente, e por isso têm massa diferente. Um detalhe importante: não é a partícula em si que produz a massa. É o campo associado a ela — uma entidade real que permeia o espaço, conforme explica Salvador Nogueira em um artigo.
Por isso é chamada também partícula de Deus, nome que os cientistas detestam, mas que exprime bem o momento crucial em que a energia adquire massa, isto é, matéria.
Os humanos estão numa posição que lhes permite tomarem consciência de que o cosmo tem um princípio ordenador. Através da ciência e de descobertas como o bóson de Higgs, podemos notar e registrar o significado aí existente.
Pensando em tudo isso, me pergunto: Será que Deus confia em indivíduos humanos para adquirir consciência de Si-mesmo, para encarnar no mundo tridimensional de tempo e de espaço, e também para rejuvenescer e dilatar Sua existência? As reflexões de Murray Stein em o Mapa da Alma passam por este caminho…
E assim caminha a humanidade, de descoberta em descoberta, aumentando seu saber sobre os mistérios da criação e tentando entender, em meio a tudo isso: O que fazemos aqui?
O bóson de Higgs foi previsto em pesquisas desde 1964, pelo físico escocês Peter Higgs, mas somente em 2012, teve sua existência comprovada pelo CERN, centro de estudos avançados da Física teórica, situado na Europa. Veja mais aqui: Bóson de Higgs, a partícula de Deus – O que é isso e em que pode nos interessar?
Bibliografia: Edward F.Edinger em Ego e Arquétipo; Murray Stein em o Mapa da Alma; Amit Goswami , em Janela Visionária e Vilém Flusser em O Mundo Codificado. Quatro livros que eu adoro
Reflexões feitas a partir de discussões realizados nos grupos e cursos do psicanalista Marcos de Santis no Instituto Humanae
Foto de abertura: pintura rupestre na Gruta das Pedras brilhantes localizado no Sítio do Rio Grande, onde costumávamos passear na infância
Por Denise Pitta
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