Editoriais, Mídia Impressa e Fotografia de Moda – A Imagem Texto da Revista de Moda / Parte 1
O traje elegante, como fenômeno popular de massa e como atividade de lazer de direito próprio, foi influenciado pelas outras atividades de lazer da idade…
O traje elegante, como fenômeno popular de massa e como atividade de lazer de direito próprio, foi influenciado pelas outras atividades de lazer da idade da máquina: o esporte, a música, o cinema e a televisão, que produziram novas maneiras de vestir.O jornalismo, a publicidade e a fotografia agiram como eixos da comunicação de massas, que ligou a moda à consciência popular.
Elisabeth Wilson, Enfeitada de Sonhos,(1989:202)
Moda e Urbanidade
Moda é o fenômeno pelo qual se manifesta a presença do novo na cultura. A palavra moda vem de moderno, aquilo que nunca foi visto antes. Esse novo tem dois caminhos, o novo que confirma o presente como nova ordem social, e o novo que repudia essa ordem, propondo novos cenários de vida, com um universo de imagens capaz de orientar e encaminhar os diferentes modos sociais de ser e estar.
A moda nasceu dentro de uma cultura urbana, tendo como função original diferenciar o homem do burgo de seu antecessor, o senhor do castelo. Portanto, na sua base, estão a condição burguesa e a demarcadora de diferenciação social. Por isso, carrega desde seu início, o discurso da transformação, que se faz sempre por meio de sinais de pertencimento e repúdio.
Ela é uma das linguagens do corpo, mas nunca houve nela uma fala universal. É feita de dialetos e, como as línguas neolatinas, tem um tronco comum, porém permite diferentes confluências grupais. Uma confluência não exclui a outra, enquanto margem do mesmo rio. Por essa razão, quando se fala em moda, deve-se falar no plural. As modas são sempre culturais e comportamentais e, com diferentes aparências, representam o espírito do mesmo tempo.
Os sinais que confirmam a ordem social presente apontam para o apropriação e a perpetuação da tradição: são as modas dos patrícios, os donos do território, os habitantes que se sentem seguros dentro de um determinado contexto social e cultural.
Já as modas de oposição contra-culturais, apontam para maneiras de ser que são estrangeiras em seu território e, muitas vezes, em seu tempo também. Quando fora do espaço, apresentam uma estética barroca, olham de lado; quando fora do tempo, são românticas, se apresentando de luto, através de estéticas de moda conhecidas como dark.
As modas discordantes pertencem ao mundo das vanguardas: através delas, os corpos vestidos se apresentam com leituras historicistas, dadaístas ou fantasmagóricas; zombam do presente, que não os comporta mais e, nas suas fantasias de oposição, nada mais fazem do que propor uma nova ordem social. Desses corpos, a sociedade tem medo e, por isso, delega a eles toda sorte de mau olhado. Como na Antiguidade, esses bandos, considerados como hordas de bárbaros, estrangeiros em seu próprio tempo, incapazes de falar corretamente, balbuciando a língua vigente, são vistos como perigosos.
Mas, como a história tem demonstrado bem, os bons bárbaros acabam se tornando doces bárbaros, transformando o feio estranho e estrangeiro na nova beleza.
Quanto aos corpos que, vestidos, buscam demonstrar a apropriação da ordem dominante, o sistema da moda cria para eles o valor da novidade, em que a roupa nova funciona como a máscara do sucesso na sociedade, em que eles transitam com eficiência.
Nessa ordem, o valor do novo representa o poder de aquisição, um valor que se mantém agregado ao trabalho ou à herança, porque sabemos que poucos podem comprar com freqüência uma roupa nova cuja única função seja a exibição. Para os que desejam se exibir, a moda é um sinônimo da apropriação do mundo dos patrícios, os donos da tradição social.
A sociedade dialoga com ambas as ordens e, hoje, as mídias estão presentes nesse dialogo, criando produtos para todo tipo de dialeto. No caso da moda, o produto midiático tem função pedagógica: é ele que instrui sobre os modos de vestir, orientando toda a cadeia, que vai do criador até o consumidor, vestido de modo a estar na última moda no que se refere aos materiais, aos modelos e aos modos.
A mídia que tem a tradição própria da moda é a impressa. Na matriz do fenômeno da moda está um sistema de veiculação de informação que nasceu junto com ele. A imprensa revolucionou a modernidade. Junto com a Bíblia, os mapas e os códigos de boas maneiras, vieram as cartas de moda, com as ilustrações dos modelos a serem usados em diferentes ocasiões.
Werneck Sodré aponta para o fato de que (1966:2): Como todas as invenções, a de Guttenberg resultou de necessidade social que o desenvolvimento histórico gerou e a que estava vinculada a ascensão da burguesia em seu prelúdio mercantilista.
As mudanças na história do ocidente e as transformações culturais daí decorrentes, foram acompanhadas por novas maneiras de apresentar o corpo vestido no espaço social; e a revista de moda, com seu jornalismo voltado para os assuntos da mulher, da casa, da saúde e do corpo, foram sempre arautos tanto do novo quanto da novidade. Seu sistema de imagens tem sido, desde o início, todo organizado para garantir a eficácia social desse diálogo da cultura com os indivíduos que dela participam.
Hoje, a mídia faz parte da cultura de massa e, no caso da moda, orienta para o uso adequado do corpo vestido, de acordo com o que o espaço social aceita. A mídia de moda é, na sua maioria, mídia de confirmação e, por esse motivo, não é através dela que os movimentos de contracultura, que se expressam com o corpo, através do fenômeno da moda, encontram seu caminho de expressão.
Mas as mídias sabem digerir os significados contra-culturais e usam, em seu sistema de imagens, sinais que apontam para direções de dissidência, comumente usados pelos grupos que transitam entre as diferentes ordens sociais. As mídias são veículos da cultura dominante, portanto, não veiculam a contra-cultura, apenas utilizam os seus sinais.
A moda é sempre nova. Mesmo quando parte de leituras estilísticas do passado, as funções, as técnicas e os materiais são novos. Uma moda nova começa a partir da rejeição do que é considerado velho e aponta para situações de vida que já não se deseja mais viver. Muitas vezes, é adotando aquilo que é considerado feio pela sociedade, que surge um novo padrão de elegância.
Nascida para manifestar um novo padrão de distinção social, que surgia no final da Idade Média, a moda teve, como função primeira, manifestar a presença de uma nova classe social no espaço urbano: a do burguês mercador que tinha, na sua nova maneira de vestir, um modo de ser reconhecido como o homem do novo tempo.
Bastante claros na vida da cidade moderna, o novo e o diferente sinalizam, dentro do espaço urbano, a revolta contra o que existiu anteriormente. Esse momento de revolta é a chave dos movimentos de estilo das modas para jovens e adolescentes. A sede de mudança que caracteriza as sociedades urbanas se expressa com eficácia no fenômeno da moda. Tal condição é facilmente observada nas linhas de moda propostas, nos anos 60 do século XX, por Mary Quant, e a força antagônica da maneira de vestir do movimento contra-cultural hippie. Assim, sempre urbana, a moda tornou-se metropolitana e, agora, é cosmopolita.
Pura linguagem social, a moda seguiu sua função estabelecendo, para o homem da sociedade industrializada, um novo código de elegância, que se disseminou para todas as classes sociais, reduzindo todas as diferenças nacionais e regionais.
Wilson (1989) fala dessa urbanidade como máscara para todas as emoções que, deslocadas para o reino da estética, intelectualizam visualmente tudo, criando um mundo que se expressa e se entende através da imagem e, nele, o modo de vestir diz respeito aos desejos individuais e às aspirações sociais.
Porém, é possível considerar que a moda aparece numa variedade de discursos distintos; ou dizer que ela é apenas um, dentre os diversos discursos culturais. A moda pode pôr em prática uma multiplicidade de discursos, de jogos de texto e de superfícies, devido à sua condição de imagem e seu poder de dialogo cultural e intra-cultural.
No entanto, também toca a origem inconsciente da emoção profunda, tratando de qualquer coisa mais que a simples superfície, mais do que a imagem nos permite ver, conjugando, através da imagem do corpo vestido, realidades opostas, revelando o que é e o que não pode ser, dando sentido de isto ou de aquilo.
É através de um sistema de imagens e de textos que a cultura orienta, para isto ou para aquilo, no uso do corpo vestido para o social. A cultura pontua isto, como moda e aquilo, costumam ser as modas contra-culturais, que se rebelam contra as referencias tidas como elegantes.
Os corpos aceitam a ordem ou se rebelam contra ela. Porém, as normas são ditadas pela cultura, e seu meio de informar edifica um sistema que lhe é solidário. Portanto, no caso das contra-modas, não é o sistema de comunicação que veicula as normas socializadoras e, sim, o próprio grupo.
Aqui, chegamos a um ponto crucial do nosso estudo: queríamos apontar o valor pedagógico da mídia impressa mais expressiva do mercado brasileiro, direcionada ao jovem adolescente, porém, fiel ao nosso referencial teórico, que aponta para o grau contestador da cultura de moda jovem e seu potencial de diálogo social.
Mas nos deparamos com um impasse: ou a mídia não é solidária com os revoltados, ou ela não é dirigida ao jovem com potencial transformador da revolta, ou seja, se a juventude contém em si o germe da renovação social, e se essa condição é vista como perigosa, uma mídia tão expressiva como a revista Capricho seria um veículo de subversão da ordem; e, se tal fato se dá, temos uma ordem burguesa em total ebulição; portanto, só nos resta ver que a revista é uma mídia de confirmação da ordem, cuja função social não ultrapassa a pedagogia do cotidiano afetivo do leitor e, como parte da cultura da imagem, é só imagem que toca as questões da hereditariedade e da constituição da família e propriedade. Sua chamada de capa pergunta:
“Você quer um namorado? Lembre-se de que ele tem de ser igual a você!” É a defesa do mesmo padrão social.
Então, vemos que, num tempo em que as barreiras morais se movimentam, os preconceitos raciais se deslocam, e fala-se da convivência cordial multi-cultural, essa mídia, que é um caso histórico dentro do mercado editorial de moda brasileiro, não cumpre de fato o seu papel socializador.
Vivemos num país multirracial e poli-cultural, com uma vida urbana cujo padrão de elegância é regido por termômetros da classe média. Esse é também o perfil da consumidora da revista Capricho.
Imagens do site da Revista Capricho e da Revista Máxima (Esplendores e extravagâncias numa homenagem à Dior nas suas seis décadas de existência e uma retrospectiva única da obra de John Galliano em 10 anos de magia e sedução naquela Casa parisiense. Fotografia de Ellen Von Unwerth.)
Leia também História das Aparências e Mídia Impressa – Revista Feminina / Parte 2
Por Queila Ferraz
(Queila Ferraz Monteiro é estudiosa de História da Moda, é consultora de design e gestão industrial para confecção e Professora de História da Indumentária e Tecnologia da Confecção dos cursos de moda da Faculdade Belas Artes, Senac Moda e Universidade Anhembi Morumbi.)
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